quarta-feira, 14 de maio de 2014

Os erros da abstenção



                   

     Numa democracia representativa, desiludida consigo mesma, a abstenção é uma forte tentação, apoiada por argumentos acerca de democracia participativa e formas directas desta (e na minha opinião, ambas devem ser um objectivo prioritário de todos os cidadãos) ganha bastante apelo, no entanto vivendo numa forma de democracia é unicamente duas coisas, a forma de se perder direitos, e de deixarmos que poucos controlem muitos, tal como nos sistemas não democráticos.
     Eis vários porquês de tal acontecer.


     1- O mundo não para por nós, e os restantes vão continuar a muda-lo, a única questão é se fazemos parte dessa mudança. E sem duvida que uma das alturas em que mais se pode contribuir para mudar o mundo é aquela em que todos podem dar o seu contributo expresso. Em todas as eleições algo muda, mas só os que votam fazem a mudança, só os que se decidem a mudar através do seu acto é que mudam o mundo, e o voto é uma das formas mais simples de o fazer.


     2- Abdicar de direitos nunca pode conquistar direitos. Por alguma razão existem quem esteja desiludido com a democracia representativa, por achar que esta não respeita a sua vontade e opinião que acha que abdicando do seu direito de voto as mesmas pessoas que não o respeitaram lhe vão dar mais capacidade para decidir e afectar o mundo, não só é contraditório mas é como parar de correr e lutar para pedir clemência a um psicopata que nos persegue. O sistema suporta a abstenção e não pára e nada nele obriga a dar mais direitos para se manter a funcionar.


    3- A democracia representativa, por ser a melhor que por agora temos, é aquela que nos aproxima e eventualmente levará a novas e melhores formas de democracia e não será a caminharmos na direcção oposta que nos aproximaremos destas. Não será com quem decidiu deixar de escolher que se encontrará a força para fazer mais e melhores decisões, quando estas têm mais impacto. Não será com aqueles que não tomaram as decisões relativamente fáceis da democracia representativa que se terá a capacidade das decisões relativamente difíceis que nos trará uma democracia participativa. A abstenção é o caminho para a falta de democracia não para qualquer forma de democracia, seja ela qual for, pois a abstenção mina o sujeito e a sua capacidade democrática e com isso mina a sociedade e a democracia que nesta houver.


    4- Um bem menor, pode não ser o ideal mas se for o único possível é nosso dever executar esse ao invés de nada fazer. Tal é o caso do voto numa democracia representativa, pode não alcançar o que realmente almejamos, mas tem o poder de deixar o mundo um lugar melhor e como tal temos a obrigação ética de votar para levar o mundo a um melhor estado de coisas. É o mesmo que um medico, não podendo curar os dois olhos de um cego se recusa a curar só um, deixando-o cego em vez de vesgo.


    5- Não são todos iguais. Afirmar o contrario são tretas e desculpas... Com 16 partidos (no caso de Portugal) dizer o contrario é apenas uma desculpa para não se confrontar os pontos acima e o próprio sistema, longe de ser perfeito permite o saneamento de quase todos os seus problemas, para tal basta que se exerça o voto em maior consciência.


    Nada impede de se participar numa democracia representativa e de lutar para que esta se torne participativa ou directa, aliás, votar pode ser uma forma de lutar.
Pode ser uma espécie de partidocracia, provavelmente é, mas os mecanismos para a mudança estão primeiro na sociedade que escolhe e se exprime e depois no sistema que é obrigado a seguir certas formas de expressão e exercendo o direito que temos, quando o temos podemos controlar o nosso destino. Mas as vezes também é necessário uma certa coragem para votar onde se pode fazer a diferença e sem medo da mudança ou da desilusão.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Divagações sobre o Rendimento Básico Incondicional (RBI)


Divagações sobre o Rendimento Básico Incondicional (RBI)


     O RBI é um conceito interessante, que consiste em entregar a todas as pessoas uma certa quantia de dinheiro que lhes permita sobreviver dignamente, independentemente de terem ou não trabalho. Aparentemente, segundo os seus defensores, é possível por em pratica e financiar o esquema, no entanto seria a solução mais indicada e justa para melhorar o mundo?

    A ideia parte do facto de que a tecnologia substituiu muita da mão de obra humana necessária para muitos dos trabalhos, especialmente os de produção de bens, logo em vez de forçar quer as pessoas, quer o meio ambiente e quer mesmo o mercado a garantirem empregos desnecessários, as pessoas teriam sempre a protecção do RBI significando que muitas poderia pura e simplesmente não trabalhar, com vantagens extras de que serviria como forma de aumentar salários e condições de trabalho, pois as pessoas não estariam pressionadas pela falta de dinheiro.

    No entanto esquece de que a tecnologia só substituiu o homem parcialmente, muitos trabalhos continuam a ter de ser efectuados por seres humanos, ou seja muita gente continuaria a ter de trabalhar, a questão urge saber se é justo dividir a sociedade entre aqueles que trabalham e os que não trabalham.

Pode-se ver isto em vários pontos:

  • Divide-se a sociedade em duas classes, uma que trabalha e além do RBI tem um ordenado (logo pelo menos 2x mais rendimento), estando claramente acima da classe dos desempregados;
  • Não existe (tanto?) incentivo social para criar emprego, logo quem está na classe dos desempregados terá muitos mais problemas em sair desta;
  • A classe dos trabalhadores pode-se sentir (talvez até justamente) injustiçada por efectivamente ter a sociedade como a sua exclusiva responsabilidade e dever (apesar de ter benefícios adicionais), aliás, talvez análogo ao que já se passa actualmente entre quem trabalha e ganha relativamente ao seu trabalho e quem recebe a miséria do RSI. Por outro lado, possivelmente não seria tanto, uma vez que também receberia o RBI pelo que ao menos se sentiria "recompensada" de uma forma mais pessoal (continuando no entanto a ser a unica a gastar oum dos bens mais preciosos, o tempo);
  • O provável e justo descontentamento dos desempregados por estarem fora das esfera de responsabilidade e dever de manter a sociedade;
  • Apesar de haver uma pequena, mas maior, distribuição da riqueza, não muda dramaticamente o paradigma de forças das várias classes, a sociedade de mercado, a privatização de bens e serviços essenciais, em suma não faz grande mossa no capitalismo;
  • Nada garante que realmente elimine a pobreza, muitos que trabalham actualmente, até por mais do que o salário mínimo são pobres ou até miseráveis.


    Quer isto dizer que o RBI é uma má ideia? Não, certamente seria melhor do que a situação actual, havendo provavelmente quem se senti-se perfeitamente bem com a situação (independentemente da sua classe), no entanto, está ainda bastante longe de ser uma sociedade justa, já que está sem uma distribuição relativamente igualitária de recursos e responsabilidades sociais.

    Para tal, ideias como a de pleno emprego teriam muito mais impacto na minha opinião (e se o RBI é financiavel este certamente também será) e tal é sempre possível reduzindo os horários de trabalho, mas mesmo essas teria de ser acompanhadas por outras medidas e pessoalmente acho que a ideia de salários/rendimentos/posses máximas, ou bastantes taxadas e redistribuídas, teria bastante efeito pois realmente afectaria o quinto ponto acima descrito.
    A ultima questão é “e se for impossível o pleno emprego ou houver 'acidentes de percurso' ?”, esta é talvez a melhor razão para haver uma garantia de que a pessoa nunca está desprotegida e talvez algo como o RBI tenha aí o seu papel...




Para mais informações sobre o RBI

http://www.rendimentobasico.pt/
https://www.facebook.com/RendimentoBasicoPortugal?fref=ts